domingo, 7 de setembro de 2014

Eutanásia

Fonte da foto: GENIZAH
Artigo de António Maria G. Lemos

Depois de ter relido a crônica “Eutanásia” que o meu falecido pai escreveu em 1962 no jornal Tribuna de Moçambique, percebi que a Eutanásia continua sendo um tema muito controverso. Debatido muito emotivamente e até manipulado religiosamente.
 Visto que não sei as condições em que a tal mãe teve que tomar (certamente) tão dolorosa decisão. Não me aprofundarei ao caso específico da crônica dele.
Uma coisa é certa, para ele abordar esse tema, é porque pelos vistos mexeu com ele, e com os códigos éticos e morais da sociedade da época.
 Do ponto visto geral, sobre  a eutanásia eu hoje  lhe diria; Concordo com o direito à vida, e que nenhum ser Humano tem o direito de condenar à morte outro ser Humano.
Por isso sou contra a pena de morte.
No entanto não considero a eutanásia como um suicídio, ou como uma pena de morte.
 Na pena de morte julga-se uma pessoa à morte por diversos motivos, ligados ao julgado, e aos julgadores. E o “crime” ditado pelos julgadores pode ser por motivos militares, religiosos, políticos, etc E mesmo em estados democráticos, onde a lei se diz neutra e pragmática. A verdade da realidade é que a justiça sempre balança de acordo com o dinheiro que se tem para se defender. Nesses países as estatísticas provam que a maioria dos acusados à pena de morte vêm das camadas mais pobres da sociedade. Exatamente as que tiveram menos chances na vida desde que nasceram, e que não têm dinheiro para pagar bons advogados. E as inúmeras pessoas que foram julgadas inocentemente por essa Justiça, não voltam mais para reclamar o seu direito à vida.
Se reconheço a Vida como direito Humano, por mais hediondo que seja o criminoso não tenho o direito de cometer com ele, o mesmo crime que abomino.
 O suicídio está na sua maioria mais ligado a um momento de desespero.
Muitas vezes consequência de um sofrimento movido por desequilíbrio psíquico momentâneo, ou de longa duração. Só quem sofre tal angústia deve saber que sofrimento é esse, que nós só teoricamente sabemos explicar, mas esperamos nunca vir a conhecer.
Para uns deve ser um “cansar de viver”. E para outros pode ser a fuga a uma nova realidade de vida, que de repente são confrontados e que não creem ser capazes de a encarar.  Há também os que suicidam por covardia. Para não terem que assumir junto á sociedade, a responsabilidade por seus crimes ou males causados.
 Já a eutanásia está sempre ligada a resultados científicos que hoje em dia, com uma grande precisão, dizem o que se pode esperar da qualidade de vida que está para começar, ou da que nos resta.
Quando se chega ao ponto de se ter que decidir pela eutanásia pessoal, ou a assumir para uma outra pessoa que se ama, é porque já se percorreu um longo caminho doloroso. É uma decisão influenciada por muitos altos e baixos, sofrimentos e esperanças, onde a eutanásia resta como a solução “menos pior”.
Ou seja, a decisão pessoal ou não, acontece depois de pensada e se ser confrontada por diagnósticos de especialistas, e opiniões a favor e contra de amigos e familiares.   É uma decisão que não dá prazer a quem  a tem que tomar por outros, mas pode ser o grande alívio de quem está sofrendo, ou irá sofrer uma vida inteira.
 O direito á vida implica para mim, em se poder realmente viver.
Seja como “normal” ou como “excepcional”, palavras que não gosto de usar. E que a cada década são trocadas por outras da ética social da época, e que provavelmente também não gostarei no futuro.
Portanto digo “realmente viver”. Cada um á sua maneira e limitações, mas Viver.
Quando o risco é de se estar “condenado” simplesmente a uma “sobrevida” uma vida inteira. Então aí, estão para mim muitos outros fatores em jogo. Qual a doença, qual o tipo de sobrevida em questão, e a pessoa envolvida.
Se penso em certas situações de sobrevida, que pudessem vir a envolver amigos e familiares, espero eu, nunca ter que decidir por eles. Mas sei que não gostaria de ver uma pessoa que amo, sobrevivendo contra a vontade dele, o resto da vida.
 E como sei que se eu um dia não estivesse mais em condição de decidir sobre a minha “sobrevida”, na minha família provavelmente ninguém conseguiria tomar essa decisão por mim. Aproveitei que na Suíça a eutanásia é legal, e já aliviei todos de tal decisão. Deixei essa situação, que espero nunca vir a acontece, bem detalhada e descrita em documento devidamente assinado  por mim, e três amigos meus como testemunhas.  O mínimo de testemunhas necessárias para assinarem esse documento legal suíço, que lhes dará direito de assinarem a eutanásia por mim.  (Dentro das condições por mim descritas no documento.)
Esse documento legal arquivado na Cruz Vermelha Internacional,  poderá ser solicitado em qualquer país. Reconhecido como a vontade de um Humano que a assinou em tempos de saúde e lucidez. E desautoriza qualquer pessoa, seja médico ou da família, a decidir o contrário.  Direito de decisão à vida e morte pessoal, a ser respeitado.
 Estando eu lúcido o suficiente para decidir, penso que também terei a coragem de o fazer. Visto que uma sobrevida amarrado a uma cama ou vir só a “vegetar”, não quero viver.
 Eu não sendo religioso, acredito e respeito a Vida Humana neste planeta.
 Com direito a decidir o fim.

5 comentários:

  1. Numa passagem do artigo do Pai, ele fala da criança ter nascido com problemas em consequência de uma droga que a mãe havia tomado.
    Considerando o ano de 1962, devia estar se referindo a um remédio lançado no fim da década de 50 por um laboratório alemãs, sem devidos testes para avaliar os efeitos colaterais de tal droga. Era a Talidomida, um calmante e ansiolítico que tinha como objetivo controlar as náuseas e a tensão típicas na gravidez.
    Uma grande parte das gestantes que usaram esta droga geraram crianças deformadas, sem braços ou pernas, ou com problemas na estrutura vertebral, ou mesmo cegas ou mudas.
    Indo ao ponto, a eutanásia, que significa “morte sem dor”, só é eutanásia se for o próprio paciente a decidir por ela. A eutanásia é um suicídio com aporte científico, onde o paciente tem o direito de antecipar o término da dor física.
    Como o recém-nascido não tem como ter concluído que viria a ser uma vitima do sofrimento físico, e nem mesmo por decidir pela interrupção da sua vida, quem decidiu pela sua morte prematura não cometeu eutanásia e sim um assassinato.
    Não avalio aqui o transtorno emocional de uma mãe ao ver o seu recém-nascido com tais sequelas gravíssimas da Talidomida, até por desconhecer o nível de gravidade destas sequelas, mas o que ela cometeu não foi eutanásia.
    P.S.:
    Sobre outras formas de se matar o próximo acobertado pela lei, como o caso da pena de morte em algumas regiões do planeta, daria um outro post.

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  2. Não sei com que sequelas a tal criança teria nascido, por isso a minha opinião não foi específica a este caso. Mas se a tua opinião também ¢ o do ponto visto geral. Aí não concordo contigo mano. Assim como não concordo com os que comparam o aborto a um assassinato.

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    1. Até acho que concordas, pois no teu texto, em outras palavras, não passas algo muito diferente do que aqui digo. A diferença talvez esteja em eu deixar mais específico que quem pode tomar a decisão pelo seu fim, abreviando-o, só o o próprio individuo.
      Sobre o aborto, longe de questões religiosas, de fato também não apoio, a não ser em casos muito específicos como por exemplo quando comprovadamente o feto sofre de anencefalia, pois neste caso existe um parto mas não o nascimento de uma nova vida. Deixar, neste caso, a gestação ir até fim é somente um masoquismo ou obrigar a mãe a passar por 9 meses de tortura.

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    2. Este comentário foi removido pelo autor.

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    3. Eutanásia é uma morte sem dor nem sofrimento para doentes incuráveis.
      independentemente se a própria pessoa decide pôr fim à sua vida, ou um ente querido que o ama, o faz por si.
      Exemplo; O casal A&B sofre um acidente. "A" sobrevive e "B" é considerado por vários médicos/ testes como clinicamente "morto". Com vários órgãos vitais mantidos "vivos" artificialmente "A"reconhece que "B" já não existe, e só o seu corpo é mantido artificialmente com "vida". Por isso "A" resolve desligar o corpo de "B" da vida artificial. Ao tomar tão dolorosa decisão, passa "A" e os médicos que desligaram as máquinas, a serem assassinos? Na minha opinião, mesmo respeitando a dos outros, claro que não.

      Eutanásia no Brasil: http://www.significados.com.br/eutanasia/
      Eutanásia na Suíça; Dentro da lei e com bastantes estudos clínicos (físicos e psicológicos) efetuados antes de um paciente ser aceite é possível ser acompanhado na "morte sem dor": http://www.dignitas.ch/index.php?option=com_content&view=article&id=19&Itemid=59&lang=en

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